PIXO

Uma das referências visuais que utilizo são as pixações (escrita com X como é utilizada pelos grupos envolvidos, ilustra o caráter transgressor inerente ao ato, uma subversão da língua portuguesa).
Assim como as tatuagens de organizações criminosas, as pichações dificilmente são compreendidas por quem não está diretamente relacionado com elas, e são também um código fechado, restrito, que comunica diretamente de pichador para pichador, “ela não se comunica com a sociedade. Ela é uma agressão. Ela é feita para agredir a sociedade” como define Choque, fotografo e envolvido com o movimento de pichação em São Paulo, em relato no documentário PIXO (2009).
Letras que podem dizer de onde quem às escreveu veio, qual seu propósito e como ele se organiza, passam quase que despercebidas todos os dias, pois tal código não é decifrado pela sociedade. A “pichação explode nas cidades, produzindo caoticidade na constituição visual do sistema urbano”, como uma espécie de “expressionismo abstrato” como foi citada por Luiz Pinheiro da Costa (Profesor da UFPA), sendo “resultante dos acontecimentos socioculturais”. Neste campo a referência principal é a cena paulistana de pichações, também conhecido como “pixo paulista” este cenário é único no mundo. Possui características tão singulares que o torna produto de exportação e é considerado um fenômeno tipicamente brasileiro, mais especificamente da cidade de São Paulo.
Falo de pixações e não de graffiti, pois são fenômenos diferentes embora estejam intimamente relacionados, vejamos as definições do dicionário Houaiss para os termos:
gra.fi.te
s. f. 1. Lápis próprio para desenhar. 2. Palavra, frase ou desenho, geralmente de caráter jocoso, em muro ou parede de local público ou privado.
pi.cha.ção
s. f. 1. Ato ou efeito de pichar; pichamento. 2. Escritos e desenhos em muros de via pública.
Essa separação entre Grafite (ou graffiti, como é comumente utilizado) e Pichação não acontece em outras línguas, como no inglês onde o mesmo termo define os dois conceitos. Aqui parece ter um abismo entre as duas práticas, uma mais facilmente associada à arte, e a outra ao vandalismo. Porém os limites dessa separação não são claramente especificados. Embora exista o entendimento coletivo de que grafite e pichação são ações diferentes, não se pode afirmar com certeza onde de fato se dá esta separação. O código penal brasileiro separa as duas atividades, usando os termos pichação e grafitagem separadamente, e não como sinônimos. Porém, as duas modalidades se encaixam no mesmo artigo da Lei dos Crimes Ambientais.
Lei N.º 9.605 de 12 de fevereiro 1998.
Art. 65. Pichar, grafitar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
Parágrafo único. Se o ato for realizado em monumento ou coisa tombada em virtude do seu valor artístico, arqueológico ou histórico, a pena é de seis meses a um ano de detenção, e multa.
Conceitualmente a separação de pichação e grafite, passa pelo argumento de que a primeira não possui elaboração ou técnicas gráficas, e é desprovida de caráter artístico, ao passo que a segunda de acordo com suas origens morfológicas, seria uma forma de expressão artístico-visual (plástica ou não) que utiliza um conjunto de palavras e/ou imagens a fim de transmitir uma mensagem de reflexão.
Mas as gerações de pichadores paulistas, ao longo de décadas, vem destruindo estes conceitos, de modo que não se pode afirmar de maneira nenhuma que suas grafias não possuem elaboração ou técnicas gráficas, e nem se pode negar-lhes um caráter artístico. A cena urbana construída na megalópole possui uma visualidade única no mundo, onde estes gráficos já estão tão adaptadas ao seu contexto que dialogam de forma coerente com a paisagem da capital paulista, onde a arquitetura serve de linha-guia para a escrita, como um caderno de caligrafia a céu aberto. Os desníveis sociais, a criminalidade, a organização espacial, e toda a multiculturalidade e caoticidade da cidade fizeram com que nela brotasse uma identificação visual singular, cheia de características tipicamente brasileiras.
Essa tipografia peculiar foi se desenvolvendo lentamente e traços de suas possíveis influencias podem ser identificadas como logos de bandas de rock, fontes góticas, etruscas, romanas antigas, runas e etc. Fatores gestuais e técnicos também influenciam nas características destas letras e dentro deste universo caligráfico, existem ainda subclassificações, onde cada grupo elabora um alfabeto característico, buscando uma identificação mais marcante.



Referências
PIXO documentário (trecho de 10 minutos)
Choque Photos: PIXAÇÃO - SP (galeria de – ótimas – fotos )
Choque Photos: PIXAÇÃO ART ATACK (registro dos ataques à faculdades, galerias e murais)
Pichação: expressionismo abstrato e caos urnbano (texto do professor Luis Pinheiro da Costa, UFPA)
O que é Grafite? (extraído do site do IBGE )
Grafite (retirado do site Brasil Escola, dentro da sessão de artes)
Os Gemeos 1 e Os Gemeos 2 (tags – pixos).